top of page
Buscar
  • Foto do escritorLara Psicologa

Você sabe o que é psicofobia? Associações entre luta antimanicomial e neurodiversidade

Atualizado: 18 de jul. de 2023


Resumidamente, a psicofobia se trata do preconceito às pessoas com transtorno mental. Entretanto, do que se trata o preconceito? Ele é o que reflete o enrigecimento sobre certos conceitos e temas, onde, muitas vezes, segue-se reproduzindo ideias que foram antes recebidas sem tanto critério e conhecimento prévio, mas absorvidas como verdades.


Só que ao entender sobre preconceito, sobra saber quem são as pessoas com transtorno. Nessa busca, logo se alcança um novo conflito: como definir essas pessoas, já que são tantos os transtornos definidos pelo DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais)? Porém, primeiro é necessário analisar de que maneira tudo aquilo que fugia ao domínio médico era tratado.


Transtorno, do inglês disorder, remete a algo "fora de ordem", alguém que não se encaixa na ordem do seu tempo (que sempre muda depender do momento histórico), diante disso, cria-se uma demanda: encaixar-se na atual norma. A mente humana sempre foi fonte de muita curiosidade, mas também de bastante mistério e medo, esses que a medicina psiquiátrica ansiosamente se empenhou em dominar, classificar e separar, assim que se cria o que se chama de "loucura".


Cada ser humano, ao ser gerado, recebe um código genético diferente que pode se manifestar de diversas formas a depender da sua interação com o ambiente, então é possível compreender que os contatos, interesses e afetos, que cada pessoa tem em sua relação com o mundo, compõe um ser único em vários sentidos. Esse entendimento pode se aplicar ao funcionamento articular, muscular, intestinal e também ao neuronal.


em qualquer indivíduo — mesmo no mais esfarrapado, mendigo egresso de um hospital psiquiátrico — existem forças criadoras, existem forças autocurativas esperando de apoio, esperando de amor, esperando de calor humano (Nise da Silveira)

A neurodiversidade é um conceito que compreende as diferenças no funcionamento das pessoas como variações naturais, não patológicas. A partir desse conceito, o que antes poderia ser apontado como algo que precisaria de conserto, passa a ser acolhido como diferença humana, ou seja, condições como autismo, TDAH, dislexia, entre outras, são variações, com valor próprio e que precisam ser respeitadas e acolhidas em suas diferenças.


A neurodiversidade valoriza a diversidade cognitiva e afetiva que cada um pode agregar. O movimento da neurodiversidade percebe que as interações baseadas em respeito e apoio em necessidades específicas, sem discriminação ou estigmatização, tornam-se mais favoráveis ao desenvolvimento humano como um todo. É importante reconhecer que as pessoas neurodivergentes podem ter habilidades excepcionais em algumas áreas, assim como dificuldades em outras, e que mesmo assim não se resumem a diferenças neurais comparadas aos neurotípicos.


A lógica manicomial é completamente oposta ao conceito de neurodiversidade, pois enquanto a primeira defende a exclusão social das diferenças, a segunda já propõe uma reforma essencial do que foi socialmente construído como ideal de comportamento. A ideia de neurodiversidade destaca que a saúde mental envolve a pluralidade dos seres, além de ressaltar o envolvimento social na produção de sofrimento.


A antiga lógica aderida é a responsável pelos manicômios, em que diversas famílias acreditaram e entregaram pessoas para serem "consertadas", muita violência e opressão contra tudo aquilo que foge ao padrão foi aceito em nome da "correção". Assim, qualquer neurodivergência é caçada, escondida, aprisionada e, por consequência, a cerca em volta do que seria aceito como "normal" parece cada vez mais se estreita, enquanto isso, a noção de neurodiversidade é um conceito de inclusão e liberdade que abre espaço para as existências.


A busca pela normalização e padronização de corpos e mentes é o que constrói os espaços/cercas manicomiais, nem sempre chamados de manicômios, já que esses podem ter muitos nomes, as vezes encontrados como "comunidades terapêuticas", mas a regra que se mantém é da manutenção dessa antiga lógica adoecedora que tudo tem a ver com a naturalização social da psicofobia.



Reflexões sobre a psicofobia:


Entre o estranhamento e o medo, levantam cercas para afastar os monstros que vem de fora. Constrangimento, vergonha e exclusão se expandem nesse território proibido da expressão genuína das complexidades humanas, e é exatamente assim que se alimenta um monstro que pode viver dentro do armário de qualquer pessoa, ao ponto de não mais caber lá dentro e roubar o espaço da cama. Qual a diferença dos de dentro para os de fora? São todas, mas ao mesmo tempo nenhuma, é que tudo depende de onde decidirem construir a cerca.


Quais são as fronteiras que separam os que serão considerados normais dos que seriam chamados loucos? O mistério sobre a mente pode trazer tanto curiosidade quanto medo, mas quanto mais se evita o desconhecido mais cresce a ignorância, então mais temíveis serão todas aquelas coisas que, por diferentes motivos, não fazem parte do nosso cotidiano. Exatamente assim que se ignora o verdadeiro perigo, o da naturalização de tudo aquilo que viola o outro, a violência cresce e se justifica na própria ignorância de estimação, somente até que essa o ataque e engula.





Referências


Conselho Federal de Psicologia, O retorno à lógica manicomial, Disponível em: https://site.cfp.org.br/antimanicomial/. Acesso em: 18/07/2023.


Couto D P; Silva M L; Teodoro E F. Do dispositivo psicopatológico: a loucura entre os muros do discurso. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rlpf/a/hPxpnmCxD7f7vhvb5xbRNvH/?lang=pt. Acesso em: 18/07/2023.


Figueiras A C M; Halpern R. Influências ambientais na saúde mental da criança. Disponível em: https://www.scielo.br/j/jped/a/TzsQpFygsrFwvLRbbSkCtbm/. Acesso em: 18/07/2023.


Machado S B, Foucault: a loucura como figura histórica e sua delimitação nas práticas psiquiátricas e psicanalíticas. Disponível em: https://www.scielo.br/j/agora/a/44fTZCNsJ55tskxMpKzbKvP/?lang=pt. Acesso em: 18/07/2023.


Ortega F. O sujeito cerebral e o movimento da neurodiversidade. Disponível em: https://www.scielo.br/j/mana/a/TYX864xpHchch6CmX3CpxSG/?lang=pt. Acesso em: 18/07/2023.

17 visualizações2 comentários

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page